Exmo. Sr.
Estamos em
dezembro… mês do Natal…
Numa
madrugada fria e escura, quando os pastores vigiavam as ovelhas que dormiam
enrodilhadas, uma mensagem foi ouvida nos campos da Judeia.
“Glória
a Deus nas Alturas e paz, na Terra, entre os homens de boa vontade!”
Estas
palavras não saíram dos abismos estrelados, nem dos mares agitados, nem dos
vales ou das montanhas silentes, nem daquelas casas de jogos e mulheres
perdidas que, em Belém, ainda àquelas horas, algazarravam.
Esta
mensagem procedia de além da extensão e do tempo, do além matéria, do mundo dos
seres incorpóreos.
Os
pastores olharam para os céus e, entre os astros que escorregavam no espaço,
viram a estrela que os levou a Belém de Judá, onde, numa gruta, na face da
montanha, havia nascido o Rei de Israel.
E
a luz resplandeceu nas trevas... E o Verbo se fez Carne e habitou entre nós.
O
Eterno Sol, o Verbo de Deus, encarna-se e nasce numa gruta.
Surgiu
e viveu numa época em que os povos debatiam-se sem rumos certos, na mais vil
desumanização do homem.
As
doutrinas filosóficas de Tales de Mileto, de Pitágoras, de Xenofonte, de
Xenófanes, de Demócrito, de Alcebíades, de Eurípedes, de Aristipo, de Leucipo,
de Platão, de Aristóteles e de Sócrates haviam degenerado no mais confuso
ecletismo e no mais angustioso ceticismo.
Roma
atingira o apogeu do Poder e da Glória.
Dominava
desde os confins da velha Escócia até as florestas do Reno e do Danúbio, desde
as costas de Portugal aos desertos da Ásia e da África.
Desaparecera
o sentimento de nacionalidade e universalidade.
Havia
apenas o sentimento de Romanidade.
Todos
os caminhos dirigiam-se para Roma.
Era
a Roma imperial que subjugava o gênero humano.
Era
o divino Otávio Augusto na supremacia da glória e do poder, na voluptuosidade
da luxúria.
Divinizava-se
um homem pelo esmagamento do gênero humano.
A
grandeza do Império firmava-se nas legiões de guerreiros e nos povos vencidos
que enchiam as galeras, as naus belicosas donde se ouviam os gemidos dos
escravos misturando-se com o murmúrio das ondas.
O
fastígio e a opulência de Roma fundamentavam-se no sofrimento dos prisioneiros
que, acorrentados, de olhos vasados, tangiam as galeras, giravam os olarias,
rasgavam as estradas e arrastavam grandes pedras para as ciclópicas construções
que ainda hoje admiramos.
Roma
crescia sobre a miséria do povo, com o aviltamento do homem.
Otávio
Augusto possuía legiões, palácios suntuosos, joias esplendorosas, perfumes
extasiantes.
Sacrificava
a virgindade das filhas do oriente e do ocidente.
O
povo sofria... gemia... arrastava-se, faminto e sangrando, arrojado à lama...
Foi
nessa época de desumanização que uma luz resplandeceu nas trevas... O Salvador
das Nações.
Revolucionou
os povos, não com a força das legiões, nem com o gládio ou a espada, mas com a
magia da caridade... do amor ao semelhante...
Como
sal, como o fermento, Cristo difundiu a caridade nas massas.
Abriram-se
os calabouços... Libertaram-se os cativos e a mulher conquistou, no lar e na
sociedade, a sua posição de companheira e de Rainha.
Caiu
o Império Romano.
A
luz resplandeceu nas trevas...
Minhas
Senhoras, Meus Senhores, minhas afilhadas...
Não
nos parece a nossa época muito diferente daquela de 20 séculos atrás.
A
luz da estrela foi ofuscada pelas nuvens negras do egoísmo e do orgulho.
O
existencialismo lançado por Kierkegaard contra Hegel e exagerado por Jean Paul
Sartre – que, destilando, em romances, a
sua doutrina, ganhou fortuna – tornou a sociedade, na prática, existencialista,
esquecida do espírito e os homens expulsaram Cristo do lar e da sociedade.
A
humanidade, depois de uma brilhante ascensão espiritual, volta novamente a
olhar só para a Terra.
Vive-se,
então, a lei do mais forte.
Intensificam-se
as explorações do homem pelo homem.
A
humanidade, espezinhada, rasteja novamente na dor, explorada, aviltada,
escravizada pelos gananciosos, outros Césares que se multiplicam em todas as
nações, produzindo, no mundo, a inversão dos valores.
A
humanidade pede pão, pede roupa, pede educação, pede paz e tranquilidade.
Promete-se
a paz.
Prometem-na
os países onde impera o capitalismo materialista enquanto os trustes de seus
milionários continuam oprimindo, economicamente, as massas.
Prometem-na
os países socialistas que substituíram a estrela de Belém de Judá por uma estrela
vermelha que somente tem trazido miséria e sangue.
Não,
minhas Senhoras e meus Senhores, eles não nos podem dar a Paz porque a Paz vem
de Deus.
É
Cristo a fonte da paz e da fraternidade. É bem certo que a natureza humana
sempre foi a mesma desde o princípio e jamais se modificará. O livre arbítrio
sempre nos dará direito de fazer o bem ou o mal. Assim Deus determinou.
Se
porém a humanidade adquirir uma visão melhor dos males que a afligem, por sua
própria culpa, saberá condenar sempre e sempre todos aqueles que se insurgirem
contra as leis da bondade, do amor, da misericórdia e da justiça.
Os
homens de boa vontade, abrasados por um amor real e desinteressado, de reta
intensão, reformando as consciências, educando os espíritos, levantando as
massas, somente eles poderão proporcionar paz entre os homens.
A
paz somente poderá advir do homem reformado.
O
lar... a sociedade... as nações... são expansões do indivíduo, são prolongamento
de cada homem.
Como
será possível construir um majestoso templo da Paz se é péssima a matéria
prima, o ferro, a pedra, o cimento, a areia, se são péssimos os operários?...
É
preciso que, interiormente, se reforme primeiro cada homem a fim de que se
possa espargir luz... calor... bondade... caridade entre os seus semelhantes.
Com
a vitória da matéria sobre o espírito... com o desprezo da estrela de Belém...
os homens desajustaram-se...
Este
estridor que profuso sobre as nações se ouve não é mais do que a ressonância de
cada coração desajustado.
A
agitação em que remoinham e são dilacerados os povos não é mais do que a
explosão de cada indivíduo insatisfeito e angustiado que, como bólide, se
deslocou do seu espaço de rotação e de sua linha de translação.
As
guerras e as lutas de classe são, finalmente, a projeção, no tempo e no espaço,
da incompreensão entre os homens, estrondeando em cada lar, sacudindo os seus
fundamentos e conturbando a sociedade.
Desajustou-se
a humanidade uma que vez, como em explosão atômica, desajustaram-se todos os
indivíduos, perdendo a energia de gravitação e de equilíbrio, energia que é o
amor real e desinteressado, amor que leva o homem ao heroísmo pelo bem estar de
seu semelhante.
Repito.
A humanidade é o conjunto das nações que, por sua vez, é o prolongamento do lar
na sociedade.
Quando
cada lar apaga a chama que ilumina e aquece, então o mundo se envolve em
trevas.
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