quarta-feira, 10 de maio de 2023

Ao Ceará

 

Ao Ceará

 


Aderson Siebra

 

Eu te saúdo meu rincão bendito

Berço de Heróis que não temeram a morte

Erguendo um brado, um retumbante grito,

Quebraram os jugos da tirana sorte.

 

Um forte grito que morreu bem longe,

Foi nas quebradas em estranha serra

Aonde a brisa festejando o monge

Passa beijando o coração da terra.

 

Se tu passaste pedestal de bravos,

Por duras lutas, por cruentas dores,

Foste o primeiro a libertar escravos

E sobre eles tu lançaste flores.

 

Tuas espadas, cintilantes, nuas,

Como donzelas tão gentis despidas,

Ao sol brilhavam nas desertas ruas,

De onde fugiram delicadas vidas;

 

Onde tombaram lutadores teus

Nessas batalhas pelo solo ardente,

E suas almas, murmurando, Deus,

Quebraram o jugo desta pobre gente.

 

Onde os perversos fuzilaram nobre

Partindo ao meio corações maternos

E os bronzes velhos com seus tristes dobres

Rompiam fúrias, parecendo eternos.

 

E criancinhas, lamentando a sorte,

Buscavam sempre desfazer o pranto,

Mas eles viam, enfrentando a morte,

Seus irmãozinhos, soluçando a um canto.

 

Viam seus manos, soluçando embora,

Se despedirem do seu ninho amigo,

E relembrando o que se foi outrora,

Abandonarem seu primeiro abrigo;

 

E penetrarem nos cenários vastos

De duras lutas, nas remotas brigas,

Com seus heroicos pensamentos castos

Volvendo sempre às ilusões antigas.

 

Ao chão tombaram resistindo às dores,

Esses guerreiros deste solo bravo,

Pedindo ao povo que lançasse flores,

Na sepultura do primeiro escravo.

 

Longos murmúrios em prisões recentes,

De sofredores, inocentes réus,

Foram queixumes, orações ferventes,

Que o mensageiro conduziu aos céus.

 

Da multidão, o derradeiro brado,

Levou o vento, percorrendo espaços,

E o teu caboclo como herói soldado

Da escravidão arrebentou os laços.

 

Nos horizontes, logo foi surgindo,

Saudando a raça que cantou vitórias

O sol radioso lá dos céus tingindo

Os teus martírios com punhais de glórias.

 

Ó terra minha, relicário santo,

Torrão de crentes, que, de paz suspira,

Deixa teu filho desprender um canto

Quebrando as cordas da sonora lira.

 

Eu te saúdo meu rincão bendito

Berço de heróis que não temeram a morte

Erguendo um brado, um retumbante grito,

Quebrando os jugos da tirana sorte.

 

Um forte grito que morreu bem longe,

Foi nas quebradas em estranha serra

Aonde a brisa festejando o monge

Passa beijando o coração da terra.

 

Crato, 1° de junho de 1944

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