quinta-feira, 16 de julho de 2020

A Dança das Cores



A Dança das Cores

José Siebra

          Um instante... e eis-me num mundo de mistérios, boquiaberto na incompreensão de sua essência e na admiração de sua beleza.
            Os corpos são fluídicos como o luar, leves como a luz das estrelas, delicados como o perfume dos lírios e suaves como o zéfiro da noite.
            Vejo-os finíssimos e vaporosos, irrequietos e fugidios.
            Talvez eu delire... mas não. Quem delira não pensa, sofre nas vagas revoltas da imaginação, num remoinho de coisas confusas e arrepiantes, uma compressão esmagando o ser, uma asfixia torturando a alma.
            Avanço por luminosos meandros, de tenuíssimas substâncias, surpreendentes em todas as tonalidades de cores, que ora se avivam e ora se amortecem, antes se distinguem e logo se confundem.
            Uma melodia encantadora, uma divina harmonia, silenciosa como o pensamento, qual essa orquestração, muda e eloquente, que sempre sintonizamos, vinda dos abismos dos infinitos espaços, em noites de plenilúnio, faz-me embevecido.
            Estarei no mundo dos seres encantados, onde vivem e proliferam os deuses? Encontrarei o trono de Vênus e o palácio de Cupido?
Vou indo, sem saber por onde, ignorando tudo e já ficando louco.
Nos objetos resistência não encontro. Em todos os matizes, num ritmo celeste, ninfas bailam em danças divinas que jamais expressou a arte humana, balançando as formas intangíveis dos divinos corpos como reflexos cambiantes de neve.  
Uma gaze safírica, tecida de fios de luz, serve de bastidores às celestes atrizes.
As cenas se repetem mais variadas, mais coloridas e mais empolgantes.
Agora compreendo, piso a fantástica região dos seres luminosos.
Assisto ao bailado das cores que, como em miragens, tudo apresentam e em tudo se transformam, nascida das vibrações atômicas, na profundeza dos seres, quando fecundadas pelo sol, e atiradas neste palco tão fantástico e tão estranho, mas tão perto e tão real.
Descubro-me mergulhado na confortadora visão deste cenário tão soberbo, tão simples e tão belo, onde o universo se estampa em formas fluídicas e luminosas, numa sucessão ininterrupta de maravilhosos quadros, o palco do olho humano, onde somente pode haver a dança das cores, pois fora dele, sem que se fale no espírito, tudo é nada mais que matéria e movimento.
Baixa o pano. Fecham-se ligeiras as pálpebras dos olhinhos vivos, brilhantes, alegres e buliçosos de minha filhinha Maria Goretti, nos quais, por alguns instantes, estive com a minha vista mergulhada.

Crato-CE, 6 de junho de 1956 

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